sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Mulheres 'multitarefa'

Tempo é algo complicado para quem precisa conciliar trabalho, casa, filhos, marido e pessoal. Correria é o que define o cotidiano de muitas mulheres, já que hoje parece impossível se ver uma mulher como as de antigamente, que apenas cuidavam da casa e dos filhos. O curto espaço de tempo para tantas funções tem prejudicado a saúde de quem não sabe administrar as tarefas diárias, e a maior preocupação delas é com os filhos, que muitas vezes acabam sem a atenção materna.




[ Na série Desperate Housewives, a personagem Lynette Scavo tenta conciliar trabalho (é uma publicitária), casa, marido e os quatro filhos. Na cena acima, ela surta de vez! ]


Fabiana Athayde Martins Araújo, 39, é mãe de Marcela de 8 anos e Marina de 6 anos, além de esposa de Renato de 40 anos, dona de casa, médica oftalmologista em uma clínica, perita do DETRAN, professora universitária, participa de um grupo de mulheres da Maçonaria que faz filantropia, faz massagem duas vezes na semana, vai à padaria todos os dias, faz sacolão toda semana, acompanha o dever de escola das filhas e as leva ao Kumon uma vez por semana. “A gente vive sempre correndo, é sair de um lugar e ir para o outro. Não tem como fazer muito diferente, é tentar ser objetiva, rápida naquilo que está fazendo, para conseguir fazer o que está fazendo no tempo certo, para logo poder sair dali e ir para os outros lugares. Não tem muita receita pra isso não”, conta Fabiana, que tem seus horários todos encaixados durante a semana.

Na casa da médica, no Bairro Serenata, em Timóteo, trabalham três empregadas, uma é babá e as outras duas são da casa. As últimas revezam horários, para que tenha alguém o tempo todo em casa, principalmente em função de Marcela e Marina, que nem sempre têm mãe em casa quando chegam da escola. “Na realidade, ainda preciso de babá, mesmo as meninas estando maiores, porque para a escola e para o inglês elas vão de van, mas precisam de alguém pra voltar com elas do Kumon de táxi. Então não teria como eu conseguir fazer tudo que eu faço se eu não tivesse um apoio importante”, explica Fabiana. Ela ainda esclarece que quando ela ou o marido têm reuniões à noite, na Faculdade de Medicina, na qual os dois dão aula, ou na Maçonaria, o outro fica em casa com as filhas. “Tem dia que nós dois temos reunião, então a babá vem e fica com elas. A gente tem a preocupação de chegar na hora de a empregada ir embora, para ficar com elas. É cansativo, mas a gente se habitua”, completa.

Mas não é só Fabiana que tem uma rotina apertada, as filhas, Marcela e Marina, já estão aprendendo a ter muitas tarefas desde cedo. “Elas vão para a escola, fazem inglês, Kumon, os deveres da escola e do Kumon e agora estão querendo começar aulas de balé”, expõe a mãe, que incentiva as filhas em todas as atividades. 

Nos fins de semana, Fabiana faz questão de ficar por conta da família: “Nos fins de semana eu não trabalho, geralmente a gente vai para o sítio, é quando eu posso descansar”.

"Em função dessa correria, a estrutura familiar acaba ficando de lado, em terceiro plano, e as pessoas não valorizam e não cuidam no dia a dia. Às vezes até a relação marido e mulher e a relação com os filhos fica abalada, porque a pessoa faz tantas coisas ao mesmo tempo e acaba deixando isso de lado e não cuidando da forma como deveria. Isso é um alerta às pessoas para prestarem atenção: não deixar a correria afetar a família. Família é tudo, é o alento, o conforto, a segurança, o dia a dia, tem que preservar a cuidar, aproveitar o tempo que tem junto" [FABIANA]

Andressa Caetano Lopes, 23, moradora do Bairro Ana Moura, em Timóteo, também é ‘multitarefa’ e tem dificuldades em administrar o tempo entre as atividades de ser mãe de três filhos pequenos, esposa de Joel de 43 anos, dona de casa e empregada doméstica na casa de outra pessoa. Além dos filhos, Lucas de 5 anos, João Pedro de 3 e Ana Luiza de 1, ela ainda está esperando outro, com dois meses de gravidez. “Infelizmente eu só tenho tempo para os meus filhos no domingo. É muito difícil fazer o acompanhamento escolar, para isso, sempre fica um serviço de casa pendente. Tenho que me desdobrar para poder dar conta. É muito difícil mesmo, principalmente por causa do horário. Tem um ano e meio que eu não tenho tempo pra mim, porque se eu tirar uma hora pra mim no domingo, eu vou privar os meus filhos de passarem um tempo comigo. Eu vivo por conta de trabalho, filho e casa”, comenta Andressa, que afirma executar as tarefas diárias sem nenhum planejamento.

Lucas é hiperativo e tem escola em tempo integral, quem o leva e o acompanha nos deveres é Joel. João Pedro tem hipertiróidismo, então precisa de tratamento e está sempre com Joel em casa. Ana Luiza ainda é nova para ir a escola, por isso, fica aos cuidados de uma sobrinha de Andressa, que é paga para isso. Joel é aposentado pelo INSS, devido a uma hanseníase que contraiu e está em tratamento. “Tudo que eu faço, o meu trabalho é para eles. O Lucas é hiperativo, então tenho que dar muita atenção pra ele e ele me cobra isso. A Aninha nem está me chamando de mãe mais, ela chama a minha sobrinha de mãe”, conta Andressa.

Segundo a empregada doméstica, sua maior tristeza é não ter tempo para os filhos, ainda muito novos para entenderem sua rotina: “O que sinto falta nisso tudo não é de ter tempo pra mim, é de dar atenção para os meus filhos. Para a gente que é mãe, o que dói é não ter tempo para os filhos, principalmente quando estão pequenos como os meus”. Mesmo com a ajuda do marido, ela afirma que não pode descansar. Enquanto está no trabalho, precisa fiscalizar o que está acontecendo em sua casa. “Eu tenho que estar por trás para dar um empurrãozinho, senão não nada anda. Estou sempre ligando para a escola do Lucas e para o hospital, para saber como é que está o tratamento do João. A Ana Luiza eu vi no domingo, até hoje não a vi e ainda nem sei se vai dar tempo de vê-la, porque tenho reunião de escola para ir”, afirma Andressa, que não vê a filha mais nova há cinco dias.

"É muita correria mesmo, de não ter tempo nem pra respirar. É tão cansativo, que quando eu deito pra descansar eu sinto os meus nervos repuxando. Às vezes eu não durmo de sono, durmo de cansaço. Nem é tanto o corpo que cansa, é mais a mente, porque eu sempre faço uma coisa pensando no que falta para fazer, olhando para o relógio para ver quantas horas faltam para eu poder descansar um pouco. Eu sonho com a minha tarefa do dia seguinte, sou muito ansiosa. Então mistura o cansaço com a ansiedade e não dá nada que preste" [ANDRESSA]

SAÚDE
Em meio a tantas atividades, a grande preocupação de profissionais da medicina é a saúde mental das mulheres. De acordo com Fabiana, que tem a medicina como uma de suas atividades, a correria do dia a dia é, sim, prejudicial à saúde, em função do estresse, que colabora no aparecimento de doenças psicossomáticas. “Há pessoas que descarregam esse estresse, mas tem gente que não consegue e às vezes acaba acumulando tudo. Então aparecem as doenças, como uma gastrite ou uma doença auto-imune. A pessoa acaba acumulando aquele efeito negativo do estresse e adoecendo” pontua Fabiana, que descarrega o estresse com os fins de semana em família no sítio e a massagem duas vezes por semana. “A minha massagem é sagrada!”, completa com risos.

Andressa conta que está fazendo tratamento com uma psicóloga, devido ao estresse, que abalou todo o psicológico da jovem. “A psicóloga me disse que eu tenho que deixar um pouco o serviço de lado, tirar um tempo para mim, cuidar de mim, porque eu estou com 23 anos e estou cuidando de casa, filho, marido e tarefas. Estou tendo responsabilidade de uma pessoa de 40 anos, estou envelhecendo antes do tempo e isso está acabando comigo. Sinto coisas que gente de 40 anos sente. Está afetando a minha saúde, mas não tem como ser diferente, tem que ser assim” expõe Andressa, que não tem nenhuma atividade para descarregar o estresse.

E será que os homens dariam conta da mesma rotina?

FABIANA – Com certeza não! O que o Renato dá conta é do trabalho mesmo, lá ele exerce várias funções. Fora de casa é o trabalho, exclusivamente, quando chega em casa, ele é marido e pai nas horas vagas. Em casa, ele quer atenção, chega buscando, não oferecendo.


ANDRESSA – O Joel nunca daria conta! Até ele mesmo fala que não sabe como eu consigo me virar em duas ou três para dar conta, que se fosse ele não daria. É muita correria mesmo. Eu acho que eu tenho mil e uma utilidades e eu sei que se eu parar, alguma coisa não vai andar, porque lá em casa eu tenho que empurrar, senão não vai nada pra frente. 
  
A mudança na função da mulher
Segundo Fabiana, há vantagens e desvantagens nesta nova realidade da mulher. Ela ganhou muito em independência, mas perdeu em convivência com a família. Além disso, a mulher não perdeu as funções que tinha antigamente, ela só adquiriu outras e precisou acumular todas. Essas atividades não foram tão divididas com o homem. “Ao mesmo tempo em que a gente ganhou, a gente perdeu em questão de tempo e de acompanhamento dos filhos, porque os eles acabam ficando mais na escola e com outras pessoas do que com a gente”, critica Fabiana. “Mas acho que não tem como ser muito diferente também”, acrescenta. 

Apesar de a rotina corriqueira ser prejudicial à saúde feminina, a médica afirma que é bom para a cabeça da mulher ter atividades profissionais. “Não é só o lado financeiro que conta, é bom para a mulher trabalhar. Ficar só em casa é complicado, a pessoa acaba arrumando muita doença, coisa que não existe. Então é bom para a cabeça, para a gente se sentir viva”, garante.

Andressa afirma que “aquele que falar que a mulher não é capaz de dar conta de uma casa, filhos e serviço, está enganado, e eu sou a prova viva disso, eu estou dando conta!”. Ela explica que há três anos, ela não tinha a necessidade de trabalhar fora de casa, era como as mulheres de antigamente, só cuidava da própria casa, do marido e dos filhos. “Quando eu me vi na situação de ter que arregaçar as mangas e correr atrás, eu estranhei muito”, lembra.

ROTINA DA FABIANA


Segunda-feira
Terça-feira
Quarta-feira
Quinta-feira
Sexta-feira
Sábado
Domingo
Manhã
Clínica Medicin (8h)
DETRAN (10h)
Clínica Medicin (8h)
DETRAN (10h)
Faculdade de Medicina
Livre
Livre
Tarde
DETRAN

Massagem

Sacolão
Clínica Medicin
DETRAN


Massagem



Clínica Medicin
DETRAN

Faculdade de Medicina

Manicure e pedicure
Livre
Livre
Noite
Padaria

Casa
Padaria

Professora na Faculdade de Medicina (15 em 15 dias)

Casa
Padaria

Casa
Padaria

Casa
Padaria

Casa
Livre
Livre


Antes das 10h: Quando não tem cirurgia, é o único horário para levar as filhas em médicos ou dentista.


ROTINA DA ANDRESSA

De segunda-feira a sábado:

Andressa levanta da cama 5h.
Às 5h30 faz almoço, para já deixar pronto para a família.
Toma um banho.
Pega o ônibus às 6h.
Trabalha até às 15h.
À tarde, volta para a casa.
Ainda à tarde, arruma a casa e lava roupas.
Termina os serviços de casa às 23h, quando pode tomar um banho e deitar.

Domingo:

Acorda às 7h, que é o mais tarde que ela consegue acordar.
Ainda de manhã, arruma a casa e lava as roupas.
Faz o almoço.
Pode dar atenção para os filhos.
“Sempre aparece uma visita”.
À tarde toma um banho, deita e descansa, “para começar a luta na segunda-feira de novo”.

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